Boooo
Eu tinha de cinco pra seis anos e estava de braço quebrado devido a alguma das minhas muitas estripulias solitárias, quando meu pai entrou pela porta da frente da casa que tinha sido da minha avó materna. Desceu os dois degraus do piso rebaixado com aquela cara de quem não ia esconder nada: a mulher que morava na casa do meu avô, e tinha ajudado a criar os filhos dele, tinha morrido. Eu sabia que as pessoas morriam, sabia que elas iam parar nos cemitérios (porque no caminho da casa do meu avô tinha um cemitério e também porque meu pai adorava cemitérios, mas isso é outro caso...) e que elas não voltavam mais. Mas até então eu nunca tinha visto ninguém morto na minha frente e, pra angústia da minha mãe, eu disse, quando perguntado, que queria ir. Meu pai me levou perto do caixão, me pôs no braço, pegou na mão enrugada e disse que estava fria. Eu tinha dado febre a tarde e não tinha dito pra ninguém, daí me causou uma certa repulsa tocar em algo frio. De lá pra cá já enterrei avô, pai, tia, primo e amigos. Conheci a sensação do vazio permanente que a ausência causa, o querer falar, compartilhar, rir junto e isso ser impossível fisicamente. Mas talvez nada disso se compare a ter de matar e enterrar as pessoas em vida, ter de fingir e sentir que elas estão inaucansavéis quando elas ainda estão por aqui ou por aí, bem vivas. Uma das muitas ironias da vida envolvendo a morte.
2 Comments:
Percebi exatamente do que você estava falando quando li apenas o título. É. Realmente "enterrar vivos "não é lá uma experiência muito boa... ontem mesmo decidi enterrar um.
=*
uma das minhas especialidades frustadas.rs.
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