Rest In Pain
Semana passada peguei com um amigo uma cópia do DVD "Live In São Paulo", do Sepultura. A bem de ser bacana, já tinha um gosto de despedida, aquele clima de "o-último-a-sair-por-favor-apague-a-luz". A saída definitiva de Iggor Cavalera do posto de baterista do Sepultura, na tarde desta segunda, 12/06, põe fim a um ciclo, uma estória e um sonho.
Como músico, Iggor expressou a frustração com os direcionamentos da banda. Já circulava no myspace.com um perfil com um trabalho solo dele há algum tempo, coisas tribais misturadas a hip-hop e eletrônico, inimaginável e sem espaço dentro do som da banda. Músicos crescem, espandem horizontes, ficam muitas vezes como gatos que crescem em garrafas. Sem espaço pra crescer, a garrafa, por fim, tem de quebrar.
Iggor e seu irmão Max sairam do fundo de um quintal em Belo Horizonte na primeira metade dos anos 80 pra criar um mercado, não pra conquista-lo. Engatinharam no meio independente, e indigente, do Metal tupiniquim, numa época de shows internacionais escassos e de um circuito underground precarissimo. O Sepultura criou parãmetros numa seara nunca antes explorada por nenhuma banda de Rock dentro do território nacional, saindo dos fanzines xerocados pras páginas coloridas de revistas empesteadas de jabá mercadológico, na raça. Na cara dura conseguiram um contrato internacional e construiram toda uma estrutura que permitiu o crescimento da marca Sepultura mundo afora.
Entrar numa loja de discos e ver uma cópia do "Beneath The Remains", no hoje longinquo ano de 1989, era como ver a seleção ganhar uma copa do mundo. Tentemos imaginar quantos garotos começaram a tocar na cola dos irmãos Cavalera. Teremos uma pálida noção do tamanho do sonho que eles ajudaram a tornar realidade. Respeitados por público, imprensa e por musicos de outras áreas, nada parecia poder parar a locomotiva Sepultura. Apenas eles mesmos.
Dezembro de 1996. Conflitos de ego fazem 3/4 da banda romper com a empresária Glória, esposa de Max. Muito cedo para um fim, a banda convoca o americano Derrick Green e inicia uma morte lenta e anunciada que durou oito longos anos. Sem contar com a estrutura internacional de antes, as turnês foram ficando mais e mais escassas, e a banda, que antes apontava tendências no mercado, passou a dar voltas em torno de si mesma, em discos redundantes e que passaram ao largo do impacto causado por obras-primas como "Chaos A.D" ou "Roots". Aproveitando do respeito que ainda desfrutavam no Brasil, seus membros passaram a explorar outras atividades: Paulo e Derrick ficaram sócios num bar e Andreas passou a fazer shows-solo com convidados; um deles, Júnior, da dupla Sandy & Jr, gerou uma crítica ácida de Iggor em uma revista especializada há cerca de nove meses atrás. Primeiro sinal que algo não ia bem.
Mais indícios: Por mais de uma vez, em revistas nacionais e internacionais, Max, a frente do Soulfly, demonstrou abertamente o desejo de tocar uma vez mais com a banda, principalmente com o irmão. Um convite mais que explícito que com certeza balançou as internas do grupo. Na hora de partir para divulgação de "Dante XXI", o disco que parecia finalmente ser a rendenção, Iggor alega motivos particulares para não acompanhar a mini-maratona de shows pela europa ocidental. Roy Mayorga, ex-Soulfly, é contratado para os shows e a boataria, veiculando a troca direta dos passes dos dois bateristas, é desmentida por Iggor em uma nota oficial. Os bons entendedores começaram aí a apostar quanto tempo Iggor levaria para estar pilotando as baquetas do Soulfly.
Nos últimos vinte e um anos, o Sepultura sintetizou o sonho de muitos garotos brasileiros. Viver de música, gravar e excursionar fora do país, ter seu trabalho reconhecido ao ponto de se equiparar, lá fora, à fama de Pelé. Com o fim, pelo menos, desse sonho, começam as incógnitas. Andreas e Paulo ficarão com o nome Sepultura? Iggor migrará mesmo para o Soulfly? Caso isso realmente ocorra, haverá uma "volta" da formação original? O fim de um sonho também é o fim de um ciclo, e o começo de outro ciclo e de mais sonhos. Juntos ou separados, ainda vêm muito barulho por aí.
1 Comments:
todo carnaval tem seu fim.
é o fim?
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