15:47
“Quanto tempo, né? Posso sentar?”. Isa escolheu seu melhor sorriso falso pra dirigir-se a Ângela. Essa caiu como um patinho e foi logo se derretendo, para desespero de Jorge, que queria ir o mais rápido possível ao ponto de venda de passagens, no meio do outro quarteirão. “Claro, linda, senta aí...Vamos por o papo em dia”
Jorge procurava não olhar direto para Isa, ficava se virando e espreitando a porta como se esperasse alguém entrar. Não queria mais travar contato com ninguém naquela cidade. Começava a se dar conta de que esperar todos esses dias, com aquele dinheiro todo e metade da policia atrás dele fora uma grande burrice. Ela não iria. Ajeitou a barriga dentro da calça.
“Seu amigo aqui não tava com você naquele dia na festa...”
“Não, ele é um...um velho amigo, não é, Jorge?
Isa sentiu uma gota de suor escorrer fria pela espinha. Era ele, não tinha dúvidas. O nome no cartão, a acareação acidental de Lígia, que aquela altura deveria estar louca ligando pra policia. Por que ele ficara todo esse tempo? Notou Jorge nervoso quando foi cruzar as pernas e bateu acidentalmente numa das malas, que nem se mexeu, parecia ter algo bem pesado dentro. (Dinheiro?).
“Esse sanduíche tá uma delicia, você não quer provar?”
“O sanduíche não, obrigada. Estava afim de dar um tirinho, você não tem um papelote pra gente cheirar uma linha ali no banheiro?”
“Não falei pra você que ela era doidinha, Jorge?”.
(Ela não vai querer ir, só tá me enrolando. Digo que vou comprar a passagem e sumo? Espero essa falastrona ir embora? Ainda tem de ir pra rodoviária...)
(Melhor não dar bandeira. Vou convidar essa zinha pra ir no banheiro e deixo a Lígia chegar com os homens. Assim não passa de coincidência eu estar por aqui.)
(Se esse Paraíba infeliz não estivesse aqui eu já estava comendo essa menina na cabine do banheiro...)
“Não tenho nenhuma, mas sabe que eu ia no banheiro mesmo assim?”.
“Te faço companhia”.
Os olhos de Jorge de repente parecem faróis acessos. Puxa uma mala para perto da outra enquanto as duas mulheres levantam para ir ao banheiro, abraçadas pela cintura. Ajeita a toalha da mesa com uma ponta mais perto do chão para encobrir as malas e espera a porta vai-e-vem do banheiro parar. Precisa ter certeza que mais ninguém vai entrar, nem que ele vai ser visto entrando. Ainda usando a ponta maior da toalha de mesa desafoga a pistola do coldre, enrosca o silenciador e deixa a arma desengatilhada. (Dois, três, cinco... Que diferença faz? Ela não ia mesmo comigo. Agora a drogadinha vai morrer de graça, senão perco a hora de comprar as passagens). Levanta calmamente, passa a mão pela cabeça (não posso chegar na casa de pai com um cabelo xinfrim desses...Em alguma parada no meio da estrada há de ter um barbeiro).
O banheiro do Verdinho tem três cabines individuais e apenas uma esta semi-fechada. Risos, uma respiração ofegante (Fazer essas imundices num banheiro), um cheiro de detergente vagabundo com aroma de pinho no ar. Empurra a porta da cabine devagar. Isa está sentada no vaso, Ângela sentada em seu colo, a roupa de costas nuas lhe cai pela cintura, mostrando a grande carpa japonesa (“É pra chamar dinheiro, gatão”). Daquela distância, tudo que precisaria era de um único disparo. Uma bala só pras duas, assim pouparia tempo e seria mais discreto (“Discrição é o meu lema, doutor!”). Mira o olho da carpa e prevê que um tiro, entrando pelas costas, mesmo desviando em alguma costela ou perdendo impacto com alguns orgãos que serão dilacerados pelo caminho, fatalmente atravessará o corpo e acertará a segunda pessoa um pouco abaixo do externo, na altura da aorta. Sem trocar o fôlego puxa o gatilho. Ângela cai pesadamente sobre Isa, que não faz barulho algum.
O relógio de parede com escudo do Palmeiras marca 15:47. Agora as passagens.
2 Comments:
conta o reeeesto!
ai, ai! já virei fã do jorge!!!
a próxima, por favor!!!
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