Terehell

quarta-feira, agosto 29, 2007

Convidado Bem Trapalhão






Meia-noite! Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

''Vou mandar levantar outra parede…''
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh'alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!




Colega, da próxima vez que você resolver fazer outra visita, venha ao menos mais cedo, porque quando você enfim se recolhe eu saio pra trabalhar.

segunda-feira, agosto 27, 2007

Helô Não Tem Dentes No País Dos Banguelas



sexta-feira, agosto 24, 2007

Deve Ser Sorte



A última vez que vi, ou melhor, ouvi, o Sampaio foi naquela manhã de segunda. Eu tinha pego no sono dentro do Santana esquentado que jogaram na mão da gente quase uma semana antes pra seguir o tal sujeito. "Levanta, levanta! O cara tá saindo!". Eu tava suspeitando que nossa campana tava furada, mas o Sampaio dizia que tinha "faro de policial" e que era só ter paciência. Acordei assustado, o sol na minha cara, o Sampaio cutucando, só acordei mesmo com o barulho do tiro e o Sampaio caindo por cima da direção. A adrenalina subiu pra cabeça, passou sono, enjôo, a ressaca, tudo. Mirei certeiro, bem no peito. Saí de perto do carro rapidinho, o Sampaio caído por cima da direção, a buzina à mil. Nunca torci tanto pra achar um ponto de ônibus. Achei um, bem cheio e logo passou uma linha que cortava uma vilazinha na beira da Avenida Brasil, onde eu morei uns tempos com uma mulher chamada Heleonora. Ela dizia pra todo mundo que era Chirley, assim, com "C" mesmo, dizia que era pra ficar diferente das outras Shirleys, mas ela não lia nem escrevia muito bem. Mas era direita, trabalhava como merendeira numa escola no Governador. Descobri que ela chamava Heleonora um dia que ela voltou pra buscar o crachá que tinha esquecido em casa. Parei numa birosca da vila, modo de dizer, era uma favela bem na beira da pista. Tomei duas doses de estômago vazio, vi todo o movimento dos homens indo e voltando do lugar onde deixei o Sampaio. Gente boa. Sampaio era civil aposentado e apesar de ter uns 50 ou 60 anos não tinha casado há muito tempo, tinha um guri de 14 anos. Me levou pra conhecer a família da mulher dele num churrasco em Cascadura. "Relaxa, rapá! Eu costumo dizer que o que a Agência junta nem Deus separa!". A Agência ia cuidar do corpo do Sampaio, ligar pra mulher, pagar escola pro garoto. E eu tinha mais era que dar o fora dali. Ainda sem comer nada fui pro centro. Atravessei a Cinelãndia fazendo um cálculo que já passava um pouco das dez da manhã. Meu estômago ardia. Contornei o passeio público, cheio de cinemas pornôs, cursos de datilografia, hotéis baratos e igrejas pentecostais. Lá no final avistei os arcos. Segui pela direita até bem embaixo e fui atravessar na faixa, bem onde bifurca a rua do Riachuelo e a Mém de Sá. Vinha um Passat, eu ia adiantado dele, na faixa, de repente puxou pra cima de mim. Voltei dois passos e voei pra calçada. Coração na boca, o cara nem parou pra ver. "Deve ser sorte. Ou o Sampaio me chamando. Não é meu dia, hoje não". Subi pra Lapa, arrumei uma pensãozinha no final da escadaria do Selaron. Coisa simples mas limpa. A dona era uma senhora com jeito de ser do norte, uns 40 anos, morena, cabelo cacheado, bem cheio. "Vêio a passeio ou a trabalho?" "Estou de passagem, desaluguei um quarto-e-sala na Tijuca, vou passar uns três dias pra chegar junto com a mudança em outra cidade". E cortei o assunto perguntando se tinha água quente no chuveiro. Ainda sem comer nada tomei o banho e saí novamente. Tomei o metrô e desci em Botafogo, em frente a uma agência de venda de passagens. Um cartaz bem grande fazia propaganda das cidades históricas de Minas. Lembrei na hora da minha tia Isaura, que morava em Divinópolis. "Deve ser sorte!Valeu, Sampaio!". Comprei a passagem e liguei pra tia. Ela, claro, ficou toda contente de saber que eu ia passar uns dias na cidade com ela. Me despedi e prometi estar lá em dois dias. Voltei à pensão e dou de cara com dois policiais saindo da casa. Fiquei branco. Conheço policial pelo cheiro, é igual ao do Sampaio, não tem erro. Um gordo de bigode me deu bom dia por trás das lentes do ray-ban. Lá no meio da sala, atrás dele, um outro, branco e vermelho que nem um pimentão, beijava o pescoço da dona da pensão. "Jorge, esse é o seu Ramalho, hóspede novo, se comporte", disse ela ajeitando o vestido. Acenou com a mão, respondi com um tudo bem e sem acreditar no susto, passei pro quarto, mais uma vez achando que era a mão do Sampaio me fazendo pagar um mico, lá do além. No outro dia fui a sala só tomar café e foleei os jornais muito rapidamente. Apenas um jornal popular deu a morte do Sampaio. "Acerto de contas ", "vingança pessoal" e "polícia investigando". Nada sobre outra pessoa envolvida ou foragida (no caso, eu). Lá pra uma da tarde a dona veio saber se eu não queria almoçar alguma coisa. Buzina da barca cruzando a baía. A cabeça do Sampaio contra a buzina do carro. Niterói lá ao fundo. Na manhã da minha saída, tornei a cruzar com Jorge quando fui fechar a conta. Ele parecia bem mais tenso e bem menos simpático que dois dias antes. "É a morte daquele seu colega aposentado, não é? Olha a gente vai na Estudantina hoje, relaxar desse teu plantão...". Agradeci a hospitalidade e rumei pra rodoviária. No outro dia pela manhã já tomava café na casa da tia em Divinópolis. "Tá tão magrinho você, João! Não devia ter ficado acanhado de ligar esse tempo todo, vinha aqui mais vezes, Rio de Janeiro é muita pressão, meu filho!". Sentindo o cheirinho da chuva batendo no chão do terreiro, me perdi em pensamento e só consegui dizer: "Deve ser sorte, tia. Deve ser sorte...".

terça-feira, agosto 21, 2007

Reincidente

Não é de hoje que o Sr. Paulo Zottolo gosta de usar o Piauí nas suas tiradinhas. Em 2005, quando ainda trabalhava para os cosméticos alemães Beiersdorf, Zottolo já se mostrava bastante "espirituoso" na hora de dar exemplos, como este à IstoéDinheiro:

Quando Paulo Zottolo assumiu a presidência da Nivea no Brasil, seu desafio era fazer a marca de cosméticos se tornar uma das mais usadas no país. E conseguiu: dez anos depois, os produtos da marca, que pertence à alemã Beiersdorf, são os mais vendidos entre os hidratantes. Também é líder na linha facial. Está na segunda colocação do mercado de protetores solares e terceiro no de desodorantes. Seu índice de satisfação entre os consumidores cresceu de 14% para 70%. “A Nivea aqui era como Teresina, capital do Piauí: todo mundo sabe que existe, mas poucos conhecem”, compara o executivo, que agora tem pela frente um pepino parecido – mas um pouco maior – para ser descascado: o mercado norte-americano.


Isso já tá parecendo...sei lá...

segunda-feira, agosto 20, 2007

E Do Lado De Lá



Pendurado no ar, é esse modo avesso de ser moderno que faz do Piauí um ponto de fuga da pintura nacional, a expressão de uma modernidade atolada num passado que ninguém se decidiu a cavalgar com determinação. Mais do que um sem-lugar no mapa ou uma paisagem “a descobrir”, trata-se de um vazio na consciência política e na matriz cultural da nação.


Texto bacana do sociólogo (sim, eles servem pra alguma coisa) Carlos Alberto Dória na Folha, ao que parece o único veículo nacional a ajudar a chutar a canela da Phillips.

domingo, agosto 19, 2007

Embargo Em Qualquer Lugar



Agora a coisa ficou bonita: O Armázem Paraíba anunciou neste sábado que não venderá mais produtos da Phillips por tempo indeterminado.

O Paraíba é a maior rede de varejo do Piauí e uma das maiores do nordeste. Há quase quarenta anos tem lojas espalhadas por Piauí, Maranhão, Pará e Paraíba; e há quase essa mesma quantidade de tempo é revendedora da Phillips.

O anúncio do boicote aos produtos da Phillips foi feito pelo senador João Vicente Claudino (PTB), um dos herdeiros do Grupo Claudino, ao qual os Armazéns Paraíba pertencem.

Populismos e politicagens à parte, esse embargo deve pesar de forma significativa no bolso da multi-nacional, já que outros estados do NE ameaçam aderir. Já o deputado Nazareno (PT) acredita que um documentário bancado pela Phillips sobre as potencialidades econômicas e turisticas do PI seria um pedido de desculpas mais à altura para a declaração do executivo Paulo Zottolo de que "ninguém ficaria chateado" se o PI deixasse de existir.

A alegria do palhaço não é só ver o circo pegar fogo, mas correr com um galão de gasolina pra ajudar a apagar o incêndio...

sexta-feira, agosto 17, 2007

With Or Without You



E o Sr. Paulo Zottolo foi dizer que o Brasil nem notaria se o Piauí deixasse de existir. Pra quê, rapaz...O Indiozinho ficou solto dentro das calças! Mas a declaração do Zottolo é apenas a pontinha do iceberg. Não só demonstra a qualidade do nosso cartão de visitas, gasto e rasgado, aí por fora quanto que a auto-estima do piauiense dorme embaixo de sete lençóis. Precisa vir um fabricante de lâmpada cutucar a auto-estima do piauiense? O Paulo Zottolo e os piauienses não sabem que a multinacional holandesa Phillips teve nas suas liades, durante muitos anos, um piauiense; que o Maracanã, o maior estádio para esportes coletivos já construido NO PLANETA TERRA teve seu cálculo estrutural feito por um piauiense; que um piauiense só não foi presidente da república por questão de dias. A grande maioria dos piauienses, junto com o Sr Zottolo,que presumo eu tem condição de entrar numa livraria e comprar um livro sem causar transtornos a renda familiar, nunca leu Mário Faustino, poeta piauiense hoje editado pela editora que tem os exemplares mais luxuosos e caros do mercado, a Companhia das Letras. Não vamos também sacrificar o Zottolo (que nome, hein,amigo?) pela sua ignorãncia. Nós colocamos a bola na marca do pênalti, Zottolo só foi lá e chutou. Mas em todo caso, só pra deixar a coisa às claras (ops), que tal cada piauiense se comprometer a não comprar lâmpadas da Phillips durante um ano? Paulo Zottolo tomaria um susto ao receber o balancete negativo e finalmente se mancaria que o Piauí existe.

quinta-feira, agosto 16, 2007

Please, Mr. Postman



Eu estava procurando me interar de datas de entrega de Sedex no site dos Correios e achei isso na parte de considerações especias. Um pouco de humor negro no feriado...

Não Transportamos

Conforme o Art. 13 da Lei 6.538/78, os Correios não aceitam e nem entregam:

a) objeto com peso, dimensões, volume, formato, endereçamento, franqueamento ou acondicionamento em desacordo com as normas regulamentares ou com as previstas em convenções e acordos internacionais aprovados pelo Brasil;

b) substância explosiva, deteriorável, fétida, corrosiva ou facilmente inflamável, cujo transporte constitua perigo ou possa danificar outro objeto;

c) cocaína, ópio, morfina, demais estupefacientes e outras substâncias de uso proibido;

d) objeto com endereço, dizeres ou desenhos injuriosos, ameaçadores, ofensivos à moral ou ainda contrários à ordem pública ou aos interesses do País;

e) animal vivo, exceto os admitidos em convenção internacional ratificada pelo Brasil;>

f) planta viva;

g) animal morto;

h) objeto cujas indicações de endereçamento não permitem assegurar a correta entrega ao destinatário;

i) objetos cuja circulação no País, exportação ou importação, estejam proibidos por ato de autoridade competente.

Além da relação acima, prevista na Legislação Postal, o Regulamento Interno dos Correios proíbe ainda a aceitação de restos mortais humanos, exceto o transporte de cinzas proveniente de cremação, que pode ser admitido, desde que devidamente embaladas em recipiente hermeticamente fechado e posteriormente acondicionado em caixa de papelão resistente.

segunda-feira, agosto 13, 2007

Blank




Cansado, amiguinhos, cansado...

E quando cansaço deixa de ser só fadiga física, mas um "estado de espírito", a coisa vai mal.

sábado, agosto 11, 2007

A Arte de Ser Incógnito em 21 Passos



(Isso era pra ter ido pro ar na época do PP. A carroça cibernética aqui deu problema na hora de publicar e eu só fui perceber que ficou salvo nos rascunhos quase um mês depois. Na falta, vai o atrasado)

01 Sair de casa num sábado às 12:30.
02 Ir pra um clube onde esta rolando um festival pra 25 mil pessoas.
03 Estacionar o carro numa rua isolada.
04 Contornar barraquinhas de caipirinha e espetinho.
05 Entrar por catracas que horas antes estavam intupidas de gente sem conseguir passar.
06 Errar a entrada do palco e ter de dar uma volta desnecessária em torno de uma piscina olímpica isolada.
07 Constatar que há um atraso de uma hora.
08 Comer um vatapé empelotado.
09 Esperar.
10 Ficar esperando em pé.
11 Ficar esperando sentado.
12 Ficar esperando encostado.
13 Nem sequer dar atenção a um show gigantesco num gramado a poucos metros dali.
14 Esperar atrás do palco.
15 Esperar sentado na escada de acesso.
16 Entrar em cena.
17 Tocar duas músicas.
18 Sair de cena quase tão rápido quanto entrou.
19 Ir ao banheiro e quase ser apanhado num arrastão.
20 Sair pelas catracas.
21 Voltar pra pegar o carro na rua isolada.
22 Voltar pra casa e ainda assistir metade de um filme antes de pegar no sono.

Ser discreto é uma gentle art, meus amigos; mas ser invisível é pra poucos.

sexta-feira, agosto 10, 2007

The Last Rock'N'Roll Swindler



O mundo da música perdeu hoje uma das figuras mais influentes dos últimos trinta anos. Ao lado do DJ da BBC John Peel, Tony Wilson foi o grande descobridor e incentivador da cena musical bretã e mais ainda da cidade industrial de Manchester, ao norte de Londres, no final dos anos 70.

Tony Wilson apresentava um talk-show na TV Granada quando se tornou um dos quarenta pagantes em um show dos Sex Pistols produzido pelos futuros Buzzcocks Howard Devoto e Peter Shelley em um pequeno cinema de Manchester. Entre os outros quarenta pagantes, pessoas que fariam parte da cena musical da cidade e do mundo na década seguinte em bandas como Joy Division e New Order, Simply Red, The Cult, The Smiths, The Fall e Durutti Collumn.

Wilson furou o bloqueio da estatal BBC ao passar vídeos de bandas punk em seu programa de TV e logo imaginou um jeito de se dar bem na efervescente cena da cidade, organizando uma festa com bandas ao vivo e criando um selo, o Factory, inspirado na fábrica de moda e idéias do artista plástico americano Andy Warhol. O Joy Division foi a primeira descoberta da Factory, e Tony Wilson não deixou de faturar com a banda nem mesmo na morte de seu líder, Ian Curtis.

Com o dinheiro ganho com as vendas do single de "Blue Monday", do New Order, TW abriu um empreendimento caro e ousado, o clube Hacienda, onde imaginava ter casa cheia todas as noites rebocado pelas atrações da Factory. O Hacienda só corresponderia às expectativas de Wilson quase dez anos depois, quando a cena Acid da cidade caiu nas graças do público e dos traficantes de ecstasy. Mesmo assim Wilson ainda revelou ao mundo os Happy Mondays, um das bandas carro-chefe da cena.

Com o fechamento do Hacienda no começo dos anos 90, Wilson voltou a apresentar seu talk-show e em 2002 foi um dos produtores da sua própria cine-biografia, "Twenty-Four Hours Party People" (no Brasil, "A Festa Nunca Termina"). Tony Wilson faleceu em Manchester vítima de uma metástase de câncer nos rins. Em abril desse ano fez sua última aparição pública, de muletas,no festival Coachella, em Indio, no deserto da Califórnia, apresentando o show da volta dos Happy Mondays .

quarta-feira, agosto 08, 2007

Cheiro de Tinta



Muito provavelmente se você chegasse na casa da família Ramos, ali na Lizandro Nogueira, quase no Mercado Velho,lá pelos idos de 81/82, teria grandes chances de ter a porta aberta por um velhinho sarará, de óculos grossos, sotaque pesado de alagoano e que fazia caretas e ficava batucando nas coisas. Hermeto Paschoal, quando passava por aqui no extinto Projeto Pixinguinha, preferia a balbúrdia da casa dos filhos do advogado e gráfico Raimundo Ramos ao hotel pago pela produção. Raimundo Ramos foi amigo de faculdade do meu pai, que, anos depois da morte do patriarca, foi ter aulas de piano com sua filha Carla, e a reboque conheceu e passou a frequentar a casa da viúva Arminda, onde também moravam Rámses, Garibaldi e Renzo, todos músicos e todos esquerdistas apaixonados. Puxado pelo braço, a casa dos Ramos me é uma das mais doces lembranças da infância. Dois pianos davam as boas-vindas a quem entrava na casa, no corredor da porta. Espalhados pela casa, escaletas, flautas, violões, discos, partituras e exemplares de "A Voz Operária", o periódico oficial do PC do B ainda clandestino naqueles anos de abertura política. Uma open house como a dos Ramos eu só viria a conhecer anos depois no Zeus de Geraldo Brito e Vera Leite. Seus muitos quartos acomodavam tanto estrelas como Arthur Moreira Lima quanto ilustres e talentosos desconhecidos a época. Lá, com as cadeiras no quintal, ouvi o barítono Raimundo Pereira, recém-descoberto e transplantado para Teresina pela batuta do maestro Frederico Maroquim, entoar uma "Ave Maria", em frente ao quarto dos fundos onde Albert Piauí, ainda cheirando a Luzilândia, guardava os desenhos que passava o tempo inteiro fazendo num grosso colecionador de páginas avulsas. Rámses era a estrela da casa. Estudante de Direito e Letras, traduzia Ezra Pound, compilava o até a pouco maldito Mário Faustino, conseguia espaço nos jornais amordaçados devido às amizades de Zózimo Tavares e Kenard Kruel, e era articulador político de tudo quanto fosse esquerda possível, mesmo que as reuniões tivessem de ser disfarçadas em inocentes banhos na coroa do Parnaíba (sim, eu tomei banho na coroa do Parnaíba, morram de inveja). Graças a seu brilhantismo e inteligência, o clã dos Ramos sempre foi reconhecido mundo afora, principalmente na área musical. Carla Ramos é uma musicista combativa, idealizadora do show do dia internacional da mulher, evento que foi adotado pelo calendário festivo da cidade e é voz presente da classe na mídia. Garibaldi Ramos é músico renomado, tendo tocado pelo país inteiro, acompanhado e acompanhando artistas do mais grosso quilate, apesar de não "largar a base". Rámses nos deixou em 98, em Moscou, de onde me trouxe brinquedos artesanais de madeira quando lá foi a primeira vez. Morou anos na Tchecoslovaquia e com a queda do comunismo na virada dos anos 90, mudou-se para Brasília, onde trabalhou para a UNICEF e o Itamaraty como tradutor. Ironicamente, apesar dele e os irmãos terem trabalhado com parque gráfico, deixou vários livros de traduções, adaptações e poesias ainda por ver a luz do dia. Da última vez que esteve na casa dos meus pais me encontrou debruçado numa pilha de LPs do Black Sabbath. "Você anda ouvindo isso?", mas ao invés de me censurar, solfejou o riff de "Iron Man". A família Ramos é um patrimônio que os amigos já tombaram faz tempo e que o Piauí ainda vai abraçar.

segunda-feira, agosto 06, 2007

Blá-Blá-Blá



Tava olhando uns blogs esses dias, notei uns textos longos, técnicos. Caramba, fico imaginando a galera de casa lendo isso. Deve ser um saco. Na faculdade me ensinaram a enxugar texto (também ensinaram a encher lingüiça, mas só em casos de emergência), a não repetir palavras numa mesma sentença, e pra piorar (ou melhorar) eu fiquei fã de uns caras que escrevem enxuto, sem floreio, sem rodeio, sem nove-horas. Assim, quando eu pego alguém que carrega nos fru-frus eu me sinto quase lendo um poema parnasiano, o que não torna maçante, pelo contrário. O grande lance é o cara ser um bom contador de estórias, tipo um Garcia-Marquez da vida, que parece estar de camisa de botão e alpercatas numa roda de "causos" numa esquina qualquer. Gosto bastante da idéia de ser coloquial com quem me lê, diminuir a distância entre eu, o que escreve, e quem lê, o que não deixa de ser mais uma ferramenta pra deixar a coisa mais palatável à leitura. Tudo depende de abordagem. Você pode escrever sobre política ou sobre furúnculos, se sua maneira de ganhar a atenção de quem lê for boa, texto salvo. Se não...aí paciência. Falar de coisas pessoais então é duplamente difícil e perigoso. É assustador pensar que seu blog pode ser um diário on-line e ser acompanhado igual a uma novela. Devassa demais. Tento ser o mais subjetivo possível nesses casos, e assim ser explícito apenas a quem me interessa. Sempre fui uma negação em matemática, e ironicamente, música é pura matemática. Por outro lado, palavras são o oposto de números, ou pelo menos uma parte maior onde eles podem sumir dentro; e são bem menos exatas e perfeitas; e bem mais fáceis de conviver.



(Valeu, Valmir)

sábado, agosto 04, 2007

Silêncio Re-Visitado



Peguei isso um dia sem querer zapeando entre os canais. O clipe original (dirigido pelo hoje requisitado Antoin Corbijn) já era um clássico, agora os caras se re-inventaram mesmo. Viajem na idéia do clip, é muito foda:

quinta-feira, agosto 02, 2007

Presente!

Não me escafedi não, calma. Só ando preguiçoso e sem assunto.

Ia postar umas coisas sobre pedais, mas acho que não interessaria a maioria...Não queria passar batido as partidas de Bergman e Antonioni, mas seria chover no molhado. Logo os dois que mais influênciaram os cineastas brazucas. Meio simbólico (assintomático) isso.

Os Khourys e Woody Allens (tem uma piada muito boa envolvendo Bergman em "Annie Hall") devem tudo a Bergman, seus longos planos fechados e silenciosos sobre expressões faciais, seus "diálogos mentais", seu existencialismo em 35mm. Antonioni não ficou atrás; como poucos radiografou a solidão do homem da cidade grande, qual o fotógrafo de "Blow Up", que caça sua musa pelas ruas e vielas em plena Swingin' London, num vouyerismo meio às avessas; ou o par Alain Delon/Mônica Vitti de "O Eclipse", alheios ao mesmo, perdidos discutindo suas respectivas relações. Enfim, fica a obra, está tudo aí.

E eu que não tinha o que escrever acabei escrevendo...